a Sobre o tempo que passa: outubro 2010

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

23.10.10

Sebastião da Gama. Por Teresa Vieira


(…)e não importa se os versos forem tomados por chaves falsas se eles abrem portas de terra ou aço verdadeiras.
E a minha mais próxima paisagem é o mar, minha livre bandeira, meu mato de ondas, meu cacho de uvas tão cisma, tão vida inteira. Tão momento de sentido.
Teresa Vieira

Relatório
1

                                  1-9-1947
Vou pelo Mar e levo enclavinhados
Os dedos num pedaço de madeira.
É da quilha, dos remos, ou do mastro?
Seja de aonde seja, se me ensina
Que não desisto de ir no Mar…

                                            SEBASTIÃO DA GAMA
                                           (Cabo da Boa Esperança)
                      

21.10.10

No remoinho das conversas. Por Teresa Vieira




A Ciência não pode deixar de ser um ramo da Filosofia para passar a ser uma auxiliar de negócio.

O progresso não se pode conceber como forma de atacar a liberdade dos homens.

O filósofo de Atenas não se confina numa cátedra nem se «planifica» a pretexto de servir interesses de uma população.

Também se não pode, nem deve, eliminar os ramos científicos que não rendem, mercantilmente falando.

O destino do Homem igualmente reside no desenvolvimento ao nível sociológico que entrecruza caminhos do saber que se encontram nas mãos dos laços de pertença e que possibilitam ao Homem uma relação de conjunto, uma relação de origem.

A União Europeia, mencione-se, deve ser igualmente local de reflexão, de identificação das questões da mecânica da vida e da felicidade dos homens, mas enquanto local e não enquanto suposto cérebro de comando que, por inércia de uns desapegados das consequências da ciência dos comportamentos, aproveita a outros que se autonomeiam os pensadores da Europa.

O Homem tem-se distraído por excesso, separando-se dele mesmo, divorciando-se de si próprio, e admitindo ser auxiliar do negócio a quem a ignorância aproveite.

Se do ponto de vista social o homem não descodifica trilhos, maior é a possibilidade de se tornar alheio ao poder burocrata que o controla, e, facilmente, se converte em massa manipulável pelo sujeito do saber e do poder.

Julgamos que a consciência do que acima referimos, em muito contribuiu para a identificação da consciência com o ser, na própria poesia de Fernando Pessoa.

Os Lusíadas constituem igualmente uma excelente contemplação da máquina do mundo e dos prémios e dores que a mesma carrega. Constitui um manifesto único da Renascença europeia. Assim, podemos atentar o quanto é possível encurtar a distância entre o observador e o observado e conferir ao espírito a sua realidade de entender.

A actual crise económica pode ajudar-nos a levar a recusar o homem numeralizado e em guerra com a natureza à qual, ao mesmo tempo, se une e se tem oposto.

É que a ética e a moral não têm tido um lugar cativo na ideia de progresso da humanidade.

De um modo ou de outro, todos dispusemos de mais bens, num reverso estranho que propagou a violência nas relações humanas, nas relações entre as nações.

Todavia, nunca a essência da extraterritorialidade da solidariedade humana foi expropriada do coração dos homens.

Talvez por isto, os valores ainda atraem actualmente os homens que, ainda não completamente mercantilizados, contêm dentro de si o triunfo do valer a pena.

A sede do poder, diga-se, é uma trajectória dentro de cada ser: assim se saiba que a seta disparada já não se vira refazendo a trajectória no sentido oposto.

E tal como o espírito tem tomado várias direcções ao longo da história, a sua mutação também constitui uma realidade.

Não esqueçamos que sempre e por toda a parte se inventaram novas formas de vida.

Até numa aula, a alegria do Conhecimento pode introduzir em cada um, o quotidiano de uma hora de festa, de uma hora de paz, de uma hora de reflexão e de uma hora de futuro.

M. Teresa B. Vieira


21 de Outubro / 2010
Sec. XXI

19.10.10

Pela Santa LIberdade! Eu, radical do centro, me confesso...


Vi e ouvi, entre as nove e as dez, de ontem, Nogueira Leite e Ângelo Correia. Subscrevo essa da necessária gestão das dependências, mas temo que nos tenhamos esquecido dessa essência da independência que, como dizia Herculano, sempre foi a vontade de sermos independentes.


Chegou a hora da verdade: a queda das máscaras destes gladiadores retóricos dos interesses instalados que vão acelerar o crepúsculo do regime, suspendendo a democracia.


Já nada é porreiro, pá! França e Alemanha preparam à pressa uma revisão do Tratado de Lisboa. Diante do mar da dita, afinal era só palha...São mais fáceis 27 ratificações na UE, do que a marcação de eleições gerais em Portugal. Apenas dependem da torneira do BCE...


Depois de mais uma homilia do grande criador de factos políticos e de mais uma encavacadela, em torno de um glorioso tabu, o socratismo meteu o principal partido da oposição na bolsa da impotência, onde o viagra dos cenários políticos os vai fazer submergir nas sombras doentias do crepúsculo do regime...


Por mim, estou de consciência tranquila: não votei PSD; não votei CDS; não votei Cavaco. Preferi fazer um contrato com quem sabe respeitar a palavra e está a cumprir o que prometeu. Continuo a não querer passar cheques em branco aos ditos porreiros pás, a comissões de honra de Belém e a comissários de Bruxelas.


Se eu fosse republicano, refundava o velho partido republicano. Se eu fosse socialista, cumpriria o modelo organizacional de José Fontana, invocava Antero e não me importava da coragem de ser minoria. E se ainda houvesse legitimistas da constituição histórica, todos seriam António Ribeiro Saraiva, aliados ao José Estêvão. Como sou liberal, seguirei Sá da Bandeira contra os cabrais. Há que resistir ao rotativismo, ao devorismo e à encenação final da vitória da casta banco-burocrática!

18.10.10

A cicuta orçamentada ou a cápsula Fénix?



E lá acordamos para mais um dia de triste e vil tristeza orçamentada, nós, os servos da gleba hipotecária, sem direito a enfiteuse, a emigração ou ao pé-de-meia, para podermos gritar que não foi o fascismo que voltou, mas um devorismo patrimonialista e neofeudal, com um estadão armado em mercantilista, tecendo loas ao superministro de sinal na cara...


Se este orçamento passar, sem mácula, em nome do calculismo das presidenciais e da futura alternância da velha manha politiqueira, receio que o sonho da nação, da república e da comunidade passe por um programa espiritual de extinção do Estado, cada vez mais cão de guarda de interesses, alimentado por impostos...


Estamos como nos primeiros vagidos do século XX, quando Fernando Pessoa alinhava na greve académica e Afonso Lopes Vieira traduzia Kropotkine. Foi nessa onda de anarquismo místico que se forjaram as éticas de convicção que ainda nos podem regenerar, se começarmos pela única essência que nos resta: o indivíduo diante do infinito!


Pobre de mim, tradicionalista, que apenas sonha corrigir o desvio absolutista que nos levou ao desespero das revoluções, quando sempre precisámos de revoluções evitadas, como foi a inglesa e a norte-americana e como o tentou ser o nosso cartismo, nessa velha arte do regime misto, como o foi a república romana que resistiu ao cesarismo. Logo, subscrevo a necessidade de extinção deste estado a que chegámos...


Antes de Mouzinho da Silveira não havia hipótese de greves como a prometida pelo sindicato dos trabalhadores dos impostos. Há quem tenha uma solução à maneira medieval: contratar os fiscais da EMEL para o efeito, ou, então, os chamados "cobradores do fraque". Os adeptos do progressismo, podem fazer um concurso público internacional e arrematar a tarefa a um parceiro qualquer da União Europeia.


Já os judeus detestavam os publicanos, tal como hoje muitos consideram que o Estado a que chegámos em forma de estadão, constitui uma entidade ocupante da república e, portanto, um estrangeiro, quando, para citar Merkl, a política de multiculturalismo falhou redondamente. E não é por acaso que os multadores da EMEL raramente são autóctones...


Entretanto, outro nosso indígena, Marcelo, em directo, vindo do Maputo, anuncia recandidatura de Cavaco e viabilização do orçamento pelo PSD. Havia os prognósticos depois do apito final. Desta, têm que ir à falência todos os apostadores. Porque deixou de haver risco. Antes de o serem, as coisas já o eram, conforme a tal ideia de suspensão da coisa.


Os anúncios de Marcelo revelam o velho branco é, galinha o põe...mesmo que esteja choca! Que choca...vem de chocallho, evidentemente! Tem a ver com aquela alimária que vai para a arena em regimes de toureio que não admitem a morte do bicho em directo. É pela calada, atrás do palco, que o transfiguram em bife...


Há quem diga que esta mistela, o tinto a martelo do orçamento, deve ser tragada porque pode ser cicuta, para envenenar o dito, numa espécie de embuiçamento. Não sou a favor destes sucedâneos de regicídio e sempre recordo que o homónimo de Atenas não foi suicidado pelos adversários, auto-extinguiu-se para cumprir as leis da "polis", incluindo as más, para dar o exemplo.

15.10.10

Então temos nação. Por Teresa Vieira



Entrámos todos numa carruagem já em andamento e ainda que as palavras e as realidades não sejam coisas fixas, grande parte da nossa culpa residiu na manutenção dos contextos e nestes, tudo o que a gente lá colocou é nosso.

Com maior responsabilidade uns do que outros, todos fizemos pouco por uma sociedade que futuramente fosse diferente em justiça daquela que encontrámos.

A nível dos próprios partidos políticos viveu-se mais de impossibilidades cénicas do que de acertos de erros para novas formas de política.

E quando quase todos repetiam já de cor o trabalho de casa agora a tabuada leva-nos ao beco e descobre-se o nanismo da criatividade para uma alternativa consistente.

Desconheço se um dia alguém chegou a deixar a luz aberta ao fundo do túnel, ou se o último que sempre lá chegou, a apagou, por desprezo para com os restantes que o seguissem.

Ainda assim, contra o impossível, é sempre possível imaginar outro impossível, mas desta feita aberto a uma sociedade que tem de deixar de ser uma coisa perigosa e passar a ser a que concebe que a maior lição, ao nível de cada pessoa, reside, acima de tudo, na capacidade que temos de provar este impossível aberto em luz e que constitui um dever real que evita o não apodrecimento da vida.

Durante muito tempo nada foi suficiente para alertar do caos. A tecnologia era auxiliar do homem e a ideologia opinativa um utensílio de uso corrente.

No que respeita ao dinheiro, ele era um recurso que media a capacidade criativa e meritória dos homens, enquanto o Estado ( todos nós ) éramos a instituição complementar também representados no tradicional choro choradinho do cá me choro pois que assim me chega mais ao bolso e menos me solicitam de esmola.
Assim a liquidez de tudo se tornava betão, e este bola de arremesso ao futuro que afinal era o presente que ninguém protegia, já que se ocupavam, agredindo-se como donos de pequenos e grandes poderes que, quando postos à prova face às injustiças, balbuciavam os tradicionais não sei, não posso ou não vi.

Neste resumo resumido da maneira de viver existe o intervalo das pessoas.

Alguém, um dia, atribuiu constitucionalmente um intervalo às pessoas, e servia o mesmo para que nestes breves minutos se discordasse a ferros das direcções tomadas, caso se sofresse daquela causa dos males da vida, ou seja, a resistência criadora de, ainda assim, se alertar para a necessidade de uma alternativa premente.

E se uma coisa é uma coisa e outra coisa é uma outra coisa, que não se substitua um poder pela adopção de um outro, sobretudo por um outro encapotado visando o apagamento da liberdade ainda que afirme o oposto.

A partir de certa altura a acumulação de desequilíbrios levou ao hábito da aceitação dos mesmos, ou, à culpa ser sempre do outro pois que quase todos se consideram  estranhos ao processo em curso ainda que o trejeito os revele.

Julgo que nos impressionou a todos muitíssimo o que se passou com os mineiros no Chile: o mesmo é dizer que nos impressionou a esperança na sua força.

Digo que a esperança, no fundo, são muitas esperanças diferentes, e por essa crença, creio que é chegado o momento de todos nos apresentarmos à Pátria remetente da missiva que nos chegou às mãos e ao discernimento.

Há que serenamente escutar a sensatez e a razão. E se esse trabalho nos parecer desde já incompleto, então temos Nação.

Então temos caminhar.

M. Teresa B. Vieira
14.10.10
Sec. XXI

14.10.10

Os resgatadores dos príncipes mineiros. Poema de Teresa Vieira



A quem pega na esperança pela mão
E com ela desce ao inferno para trazer o horizonte
A quem agarra na decisão e a gruda ao peito da última tentativa
A quem desfolha a firmeza de uma arvore em amor humano
Em amor desvendado
Em solução vertical
Expõe ao mundo a pele do pensamento
Dos primeiros sentires do coração
Expõe a todos nós o exemplo que demonstra
O quanto é necessário insistirmos noutros ângulos
Que nos permitam olhar o impossível
Celebrar o revés na intensidade da vida
E colher o sossego da estreita salvação do homem pelo homem
Num encontro aberto.
 
Teresa Vieira
14.10.10
Sec.XXI

13.10.10

Os príncipes mineiros. Poema de Teresa Vieira



Existem gritos que se detêm junto a nós
Como querendo consolar-nos da vida
Regressam estes gritos regressados eles próprios de um outro indizível local
E os nossos silêncios comprovam-nos
O quanto é misterioso intuirmos que o nosso secreto entendimento
Também surge de uma direcção sem remetente
Ainda que do centro de uma terra feita quase tumba
E eis que a eternidade não os esqueceu
E os guia um a um para olhar o céu do mundo
E não para abusar da luz
Antes para abrir o caminho da alegria.

Teresa Vieira
13 de Outubro/ 2010
Sec. XXI

12.10.10

Lembrança a lembrança. Por Teresa Vieira.

“Não gosto muito daquelas fés inabaláveis e indiscutíveis porque lhes falta exactamente a provação de acreditar (…) os grandes mandamentos não são impostos à nossa inteligência mas aos nossos sentimentos e àquilo que eles determinam”.

Eu pude escutar de António Alçada Baptista estas palavras.

Há privilégios poderosos.

M. Teresa B. Vieira

10.10.10

Às vezes os domingos são assim: nomeações. Apelos. Por Teresa Vieira



Um dia na aldeia do Miguel é o mesmo que dizer um dia na Aldeia de Lazarim. E dizer Lazarim é também dizer que ela é irmã de uma outra aldeia bem pertinho que é a Aldeia da Anta de Mazes.

Miguel é um atento filho de Lazarim. Diz-me, orgulhoso, que na sua aldeia o principal são mesmo as relações humanas. A cordialidade e o respeito entre as pessoas, o conhecimento calado que todas têm do mundo, mesmo que só tenham visitado a aldeia das casas de pedra e dos telhados de colmo que é a Aldeia de Anta de Mazes.

Depois a beleza paisagística de Lazarim é única. Tudo é único no local onde aprendemos a andar, mas ainda assim, há locais com cheiro de terra molhada ou de milho seco nas eiras que dificilmente se explica para quem não conhece o coração dos países.

É também célebre o caldo de farinha que por aquelas bandas se cozinha. Também os enchidos tão conhecidos ali da região de Lamego e fazem as delicias dos passeantes e dos residentes.

E a sazonalidade das vindimas e das empas e dos pomares e das hortas!? Tudo casa. Tudo lar. Tudo refugio quente como são as realidades que nos entendem.

E as máscaras? As célebres máscaras de Lazarim? É um Carnaval muito diferente daquele que conhecemos. É um Carnaval que, em meio pequeno, se deixam à mostra os segredos dos namoricos e das paixões trocadas. É um Carnaval que ninguém pode levar a mal como único dia em que muitas verdades se dizem a rir, enquanto a população envelhecida já as tira de cor, dos tempos em que eram eles os portadores das máscaras e que falavam as proibidas coisas das alcovas de Lazarim.

Coisa única de se ver e de se viver ! Os próprios formatos das máscaras e o material de que são feitas, envolvem a história de séculos que por ali se quedou presa também a Sta Bárbara, que é a protectora de outras festas em que o leilão das carnes oferecidas reverte para a comunidade.

Quando questionei sobre os problemas da política chegarem ou não até àquela terra, pois, como seria razoável de se entender, a realidade política gira à volta do Presidente da Junta e da sua eleição. Ainda que se entenda a existência necessária do Presidente da Republica.

Diz-me ainda o Miguel que os habitantes de Lazarim sabem bem o que é a pátria, o que ela significa, mesmo que Portugal tenha de caber entre o espaço da vinha e o fontanário: a pátria a ninguém confunde e a todos toca na defesa.

Mas falta à aldeia de Lazarim um apoio aos idosos. Muito gostava o Miguel que existisse uma casa, um lar, onde se possam encontrar as pessoas mais velhas da aldeia e onde possam ser acarinhados nas dores dos anos que chegam ao corpo, e nos sorrisos das conversas que recordam tempos distintos e que se perguntam aos dias que correm.

Se acaso destas palavras surgir o apelo palpável para a construção de um espaço que acolha estas gentes que vivem no coração de Portugal, este Domingo já valeu por si.

Obrigada

M. Teresa B. Vieira
10.10.2010
Sec XXI

A Filarmónica Fraude: um partido independente. Por Teresa Vieira

Recordo que Fernando Rui Linhares, catequista na Igreja de Sta Isabel em época áurea dos sons da Capela do Rato e estudante de Direito, era irmão de Luís Linhares, sendo este um dos membros da Filarmónica Fraude  - o grupo de Tomar - que por volta do ano de 1969 lançou o vinil de 45 rotações que, se a memória me não falha, continha a célebre canção cuja letra rezava assim: “Chegaram carros àquela Igreja toda enfeitada com cravos brancos, rosa e cereja tudo gente muito bem (…) rebenta a bomba só passaram 4 meses do dia que a boda se deu e ela já aqui vem a casa com o filho que hoje nasceu”.
Que se me desculpe os lapsos pois cito de memória a letra que julgo ser a da canção “Flor de Laranjeira”.
Recordo-me miúda, quando escutei um ensaio desta Filarmónica pela mão do meu catequista Fernando Rui, e recordo que a letra da canção que menciono acima, me deixou estupefacta pela verdade revolucionária que têm as verdades ditas no tempo próprio.
À distância, e ao longo dos anos, muitas vezes pensei na mordaz critica social que estava contida nas letras das canções rock progressivo da Filarmónica Fraude e, tanto quanto recordo a censura também não a deixou viver sem problemas, tendo sido “Flor de Laranjeira” proibida na Emissora católica Portuguesa.
A verdade é que o tempo da Filarmónica Fraude era o tempo das flores e das calças à boca-de-sino. Era também um tempo de epopéias no abalar das consciências.
Era o tempo em que eu e a minha muito amiga Dulce ficávamos a aguardar que o crescimento nos desse a hipótese pública de demonstrarmos que tínhamos entendido alguma coisa profunda acerca daquelas canções de um claro e emaranhado universo, através do qual vimos um dia, Luis Linhares ensaiar na bateria uma revolução de sons, lá pelos lados de um sótão de Campo de Ourique (??). Seria? E seria o Luís ???já que o tenho pelo rapaz do piano? Não sei, nem importa.
Sei que a Filarmónica Fraude vai editar novamente por este Natal e não queria deixar de frisar a abundância de idéias que este grupo semeou em seu tempo, sem precisarem de exibir curriculum, nem de fazer juras eternas por qualquer cartilha.
Pela mudança e contra a repetição dos pensares; pela porta que se fecha e que esconde sempre a que se abre, de que a vida continua, apesar de nós e para além de nós, lembremo-nos desta filarmónica e da fraude (que faire donc?) generosa que então nos deu as pistas e os traços de vários sonhos por abrir.
M. Teresa B. Vieira
Domingo 10 de Outubro de 2010 do sec.XXI

8.10.10

Liu Xiaobo: um horizonte de alerta à defesa dos direitos humanos. Por Teresa Vieira


Liu Xiabo um dos assinantes da Carta 08, manifesto pela liberdade e democracia na China, manifesto igualmente assinado por algumas centenas de intelectuais defensores dos direitos humanos na China, acabou de ser nomeado Prémio Nobel da Paz.

A sua mulher, Liu Xia afimou ao The Guardian que ele não sabia sequer que tinha sido nomeado porque não é permitido o acesso a notícias exteriores aos prisioneiros nas condições de Liu.

Liu Xiabo é poeta e professor de Literatura e encontra-se preso sob a acusação de ter violado a lei chinesa por agressão clara ao totalitarismo vigente.

Liu já tinha estado dois anos preso em 1989 por ter participado nas manifestações na praça Tiananmen.

Voltaria a ser novamente preso por falar contra o sistema de partido único da China.

Afirmam as notícias que o ministério dos negócios estrangeiros chinês avisou a Noruega para que não houvesse prémio para Liu Xiaobo pois criaria problemas entre a China e a Noruega...

Também muitos contestam a atribuição deste prémio a Liu afirmando que ele não pressionou empenhadamente o governo chinês face à lesão continuada dos direitos humanos e que até terá difamado outros lutadores pela liberdade na China.

Contudo, Václav Havel, Desmond Tutu e outros lutaram pela atribuição deste prémio a Liu.

Creio que o fundamento histórico desta decisão da atribuição do Prémio Nobel da Paz a Liu Xiabo visa dar voz a todos os que com ele, neste preciso momento, ainda pagam nas masmorras da bárbara prepotência, pelo mero direito de desacordo face a um domínio tornado morte-viva sobre a vida dos humanos.

Existe ainda uma espécie de qualquer coisa de cano que atravessa a história cortando-a e ceifando os valores-referência-base do direito de ser livre.

Essa espécie de qualquer coisa de cano que refiro é o lado escuro de tudo e que só é vencido pelo cósmico de cada um de nós.

Assim vivamos todos o suficiente para não partilharmos o nosso oxigénio com estas estranhas pragas de sobreviventes que ainda tolhem a vida no seu pleno.

A hegemonia tem de se afogar no seu próprio ácido e que cada vez menos haja a necessidade de um Prémio Nobel ser atribuído pela denúncia na tortura estruturada com que se pretende derrubar os direitos fundamentais do homem.

Aí sim, residiria toda a força de um direito da humanidade. E que cada pessoa possa ser uma pessoa de vários textos e de vários livros, para que finalmente se inicie a aprendizagem.

Um dia um dos contos das Mil e Uma Noites dirá que a Terra e os animais tremeram no dia em que os homens alcançaram a paz no interior de todos os mais elementares direitos e deveres.

Creio que a esta realidade chamou Joaquim Magalhães aquela que engloba

O ar fendido pela borboleta

Quimérica e noturna e de cor azul.

M. Teresa B. Vieira

8.10.10

Sec.XXI

7.10.10

Mario Vargas Llosa: o Escritor para quem La Literatura es fuego. Por Teresa Vieira.




O escritor peruano Mario Vargas Llosa é o Prémio Nobel da Literatura de 2010.

Para mim a Literatura é também um reflexo do real, um horizonte, um real literário e cultural um tudo no que Mallarmé disse naquela célebre frase “tout existe pour aboutir un livre”.

Vargas Llosa que está em Manhattan a leccionar neste momento na Universidade de Princeton, nunca deixou por dizer o quanto a Literatura fora o seu primeiro berço simbólico.

Vargas Lhosa teve, na minha opinião, um método curiosíssimo de libertar a contradição no esclarecimento das estruturas do poder, preocupando-se particularmente com os países onde não há democracia ou onde a liberdade está ameaçada.

Vargas Llosa empenhou-se sempre na  luta pela liberdade individual: na luta por um valor criativo e sem derrota. 


Recordo a riqueza de detalhes sobre a vida do sertão baiano. Recordo o quanto ele sabia distinguir uma verdade pensada de uma verdade enquanto resultado diferido de algo que acontece.

“A Guerra do Fim do Mundo” (1981) e a  "A Casa Verde" (1966) livro muito autobiográfico, são ambos manifestações óbvias de um grau de perfeita boa consciência cultural.

Acredito que Vargas Llosa será sempre um revolucionário perfeitamente de acordo com o seu raciocínio e também um conservador que não escapando às sociedades arcaizantes, se permite em liberdade, a explicação antropológica e social que sempre condiciona o homem.

A realidade dos oprimidos e a sua arguta denúncia será sempre conteúdo a não esquecer na Literatura de Vargas Llosa.

M. Teresa B. Vieira

7 Outubro 2010-10-07 sec.XXI

Contra as nacionalizações sacristas ou revolucionárias

Tanto sou contra as nacionalizações revolucionárias, como rejeito as episcopalizações do mesmo género patrimonialista. Se não houver contenção não tardará, como em 1917, que o sindicato em causa promova a criação de um partido, ou braço político, como o foi o CCP, que tanto deu raia em votos como lançou Salazar como deputado, ao lado de um administrador do banco de Alves dos Reis...

Estou farto de PEC I, PEC II e PEC III. Temo que novo PEC Santo entre num dos orgulhos multisseculares da sociedade civil portuguesa, ainda por cima através de uma sigla que me faz lembrar o velho Corpo Expedicionário Português, o comandado por Gomes da Costa.

O nosso hierarquismo paternalista tanto levou a que o partido "democrata-cristão" de 1917 nascesse de uma decisão institucional dos bispos, como, depois, com o mesmo protagonista, provocou que o partido único do regime autoritário nascesse de uma Resolução do Conselho de Ministros. Um lastro que ainda marca o tique centralista e concentracionário da presente partidocracia.

5.10.10

O meu 5 de Outubro em farpas emotivas contra o situacionismo, aqui em retrato

1
Machado Santos, com os homens e mulheres da Rotunda, os heróis de Naulila e os soldados das trincheiras quase mereciam que o Gomes da Costa irrompesse pela Praça do Município com heróis do mar e nobre povo e, em nome da autenticidade, acabasse com a palhaçada do "apparat" deste estadão.

2

Que saudades temos da austeridade do primeiro chefe do governo provisório da república, Teófilo Braga, dito "o guardador de patos", que ia para o palácio de Belém no eléctrico da Carris. Basta comparar com a frota automóvel mobilizada por esta classe política para aparecer na televisão...


3

Reparo que nem lá falta o "Passarão", um dos altos hierarcas do situacionismo, que eu sempre conheci fiel e repetidor do papá, ilustre deputado da União Nacional. Acabei de o ver, de mão dada com outro sempre-em-pé, antigo elogiador palavroso de Caetano pelos jornais de então. República sem "adesivos" e "viracasacas" não podia ter cem anos de torpezas, com 48 de ditadura e meia-metade de decadência


4
Não há "os" monárquicos nem "os" republicanos...há a liberdade cívica, de um lado, e o fanatismo, a intolerância e ignorância, do outro. Foi para isso que se desembarcou no Mindelo de azul e branco!

5
Basta ver a lista dos "viracasacas", ex-ministros e deputados da I República que até foram deputados na primeira Assembleia de Salazar. Incluindo traidores declarados do GOLU que fizeram o parecer da primeira lei do Estado Novo que extinguiu a ordem que nos regenerou em 1820 e 1832? Traulitânia...eu ainda ontem aqui defendi Luís de Magalhães e Paiva Couceiro...Até invocando os testemunhos de Basílio Teles e Guerra Junqueiro. Em política de crenças não há o preto e branco...

6
Não digam "os" republicanos, mas "certos". Que nisto de "estadonovismo" se congregaram com "certos" monárquicos...aliás, o embaixador britânico, em 1926, antes de 28 de Maio, em relatório, apontava António Maria da Silva como um potencial líder fascista. Claro que era mentira, mas não deixando de ser sintomático dos tiques habituais dos que nos consideram mero protectorado...mandando assassinar os Gomes Freire, quando, felizmente, há luar!

7

Desliguei o aparelho de TV lançado pelo Camilo do Cachão e zip-zipado pelo Ramiro Valadão. Prefiro ver uma fita do Canal Hollywood, antes de ir rever o Avatar no computador. Não há meio de haver uma revolta dos indígenas neste planeta Pandora, ocupado e colonizado pelos passarões...


8
Hitler era república...a Arábia Saudita, uma monarquia. Salazar foi 40 anos republicano. E os Países Baixos e a Espanha optaram pelo rei e pela liberdade, depois de experiências republicanas. Até Londres, depois do totalitarismo da república de santos de Cromwell.

9

Vi nos noticiários da uma que tanto Cavaco como Sócrates gostam do som do conceito de Max Weber sobre ética da responsabilidade. Mas dão ao nome um conteúdo totalmente contrário, ficando-se por uma sociologia de cola e cuspo, bem pouco "compreensiva"


10

Os republicanos do 5 de Outubro tinham o sonho de uma "alma nacional" e cumpriram esse patriotismo sentido até na Grande Guerra. Honra lhes seja e que se cumpra esse projecto. Apenas falharam quando pensaram que ainda não havia povo era necessário "construir o povo", conforme as palavras do inesquecível João Chagas...


11

 A televisão do Estado diz que Manuel Buíça foi um dos heróis da República. Espero que este apelo ao terrorismo não faça ricochete!


12

O regicídio de 1908 provocou o assassinato de Sidónio em 1918, de Granjo, Machado Santos e Maia, em 1921, e de Delgado em 1965. Da monarquia liberal, não consta nenhum destes registos. Nem sequer o de prisioneiros políticos. A honra da presente constituição não devia ser ofendida com estas memórias fratricidas e magnicidas, para gáudio da historiografia jacobina!


13

 Não estou a ver Mário Soares de carabina contra ministros do Estado Novo. Nem o meu amigo Carlos Antunes das Brigadas Revolucionárias, que teve o Tomás na mira, quis carregar no gatilho! Já chega de sangue!


14

O Povo na monarquia liberal: potenciais votantes em 1895: 863 280; recenseados na I República (entre 471 557 e 574260). Temia-se os votos dos "cavadores de enxada". Com o sidonismo, chega-se a um colégio eleitoral de 900 000 e 500 000 votantes, uma excepção que confirma a regra censitária.


15

Daí que a Ditadura tenha desbaratado plebiscitariamente: Carmona teve quase o dobro dos votos de todos os partidos concorrentes às eleições de 1925... Vale-nos que o regime actual já em 1975 tenha chegado a 6 231 372 contra os 1 800 000 recenseados de 1973! Só neste regime se perdeu o medo do povo!