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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

30.11.09

Antes do desmontar da tenda de Belém e de acabar a estada no miragem...


A pátria está de tenda montada diante da Torre e vai dormir ao miragem, com muito Colombo, mas sem furo no ovo nem bons selvagens. Até ao desmontar da feira da imagem, até batem leve, levemente. Não é apenas chuva, nem apenas gente. A neve vai caindo e o degelo não vem. Prefiro comemorar a Restauração, porque sem 1640 não haveria Brasil, como assinalava Agostinho da Silva, na sua eterna metapolítica.

Estes longos directos, vindos da cimeira, se confirmam Portugal como excelente mestre de cerimónias, contrastam com a putrefacção institucional interna, mas fazem-me recordar que, em termos de política externa, vale a pena o consenso nacional, em ritmo de fado com saudades de futuro...

Contudo, não podemos esquecer que Assembleia da República demonstrou que o governo tem apoio apenas minoritário. Sócrates qualificou este activismo da coligação negativa como "governo de assembleia". Apenas veio confirmar que até agora vivemos em assembleia de governo. Ou melhor, tivemos governos e parlamentos de directório partidário, em regime de chanceler, ou de presidencialismo de secretário-geral absoluto, odiando forças de bloqueio...


Porque absoluto quer dizer "ab" mais "solutus", isto é, solto, em soltura, sem controlo pelos contrapoderes da velha engenharia de Montesquieu. "Checks and balance" é o velho e eterno nome da democracia pluralista, o exacto contrário do centralismo democrático, herdeiro do jacobinismo...


Poder em soltura, sem controlo, é governança livre das leis que ela próprio pode fazer, bem como governança onde tudo quanto ela diz é lei, mesmo que o diga em propaganda de corredor ou de átrio, como "slogan" de telejornal. Sócrates II não é Sócrates I e o queijo limiano da barganha subiu de preço: já custa qualquer coisa que se situa entre o bloco central e o portas do dito, dado que Dimitrov já era...


A não ser que as oposições que temos deixem o governo governar, como aqueles jogos onde o vencedor resulta da mera falta de comparência do adversário. Em todos os casos, quem perde é o povo, assim dependente de uma coligação negativa e da consequente hierarquia daquelas potências a que chamavam forças vivas e que, em muitos casos, coincidem com os chamados "empresários do regime".

Mas vamos esquecer o défice, o endividamento e os governadores civis que ascender ao Olimpo por perderem as eleições. A comarca experimental do Baixo Vouga continua a mobilizar recursos em cauções para o erário público, naquilo que os do costume chamam divertimentos...


O Estado a que chegámos é cada vez mais um Estado Novo que afinal é Velho. Quer, pelo decretino, rever a história e, enredado na literatura de justificação, junta salazarismo e estalinismo, sem reparar que só é novo aquilo que se esqueceu, que só é moda aquilo que passa de moda. Tem a cara dos governadores civis, vive das posses e das eméritas medalhas de homenagem...

Há salazarentos que odeiam Salazar só porque ele era mais inteligente e mais honrado do que muitos dos ministros de tal regime. Infelizmente, até hoje só conheci, entre os insignes ficantes do dito, patifes inteligentes, honrados burrinhos e emproados de província, com gravata e restos de brilhantina, todos cheios de rebentos da ultra-esquerda, chamando fascistas aos dissidentes face ao obediencialismo, só porque conseguiram enrodilhar os situacionismos posteriores e odeiam as lealdades básicas que seguem as ideias de obra ou de empresa...