a Sobre o tempo que passa: Discurso de quem quer partir daqui, deste sítio de cobardia, e tenta a arte de ser português à solta

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

8.10.09

Discurso de quem quer partir daqui, deste sítio de cobardia, e tenta a arte de ser português à solta



Foi um dia de sol entremeado por breves bátegas de um Outono lavado, para que se esquecessem as canseiras demagógicas de três campanhas, onde, no final, o povão vai ter os deputados, os governantes e os autarcas que merece, para poder continuar a lamuriar-se e a lavar as mãos como o Pôncio, entre o dobrar da espinha e a canalhocracia, nesta inquisitorial hipocrisia, "onde ninguém a ningém admira e todos a determinados idolatram".


As sondagens dão Isaltino com maioria absoluta. As imagens dão Alberto João a mandar abrir cartazes contra os "fascistas da Madeira velha", só porque o meu antigo aluno Baltazar lhe deu a volta à mioleira. As notícias internacionais da sacanagem dão Berlusconi como o efeito da pós-partidocracia, a gangrenada pela mafia e pela sacristia. E há 97 deputados deputados do PS contra 102 do PSD+CDS, 16 do BE e 15 do Jerónimo.


Há um povo dobrado à imagem e semelhança da servidão voluntária com que se deleita, um povo que reproduziu, em servilismo e caciquismo, um irmão-inimigo, o estadão, com quem se vai bipolarizando, como Janus que não é começo, mas continuidade, onde uma das faces é o passado fradesco e malhador e outra, um "fake" de pó de arroz que se finge progresso. Mas ambos têm a mesma putrefacta origem: o fanatismo, a ignorância e a intolerância.



O Carvalho (Silva) foi tomar café à Brasileira, o Costa estava apenas a entrar para o metro, ambos disseram esquerda, para, depois, Jerónimo, devidamente autorizado, confirmar que Silva (Carvalho) apoia, por escrito, a CDU. Santana não é candidato a líder daquela direita que ameaça ter a sobremesa mais estúpida do mundo, ao delamber-se em "vichyssoise"...



E lá vamos cantando e jogando à bordoada, entre o "radical chic" e o reaças vestido de lente, com um pé na anca das grandes patroas dos palácios e outro nas cónegas vilafrancadas. E, de congreganismo em congreganismo, nos vamos definhando em diluentes cadaverizações. Que vão todos tomar chá das cinco aos salões decadentistas das fidalgas burguesias que nos endireitam em traições de aristocretinos!


Luís Represas, Nicolau Breyner, Rui Veloso, Zé Castelo Branco... Talvez o Luís Filipe Vieira apoie a Ana Gomes. Felizmente que, do lado Norte de São Julião, já é outro concelho e, apesar de morar na freguesia da Carvoeira grande parte do ano, tenho voto belenense se for mesmo votar...


E muitos elevam em hossanas salvíficos certos adiantados da verbosidade populista, para que o pirómano que o fez, o prometa bombeiralmente desfazer. O problema não está nos paradigmas ditos novos da mobilidade, mas na própria imobilidade de discursos que nos afastam da política e da cidadania, quando os ministros passam a ser mandados pelos directores-gerais, para quem a modernidade é a pirataria de falsas ideias roubadas às centrais dos eternos imperialismos que nos desfazem a autonomia de pensarmos pelas nossas próprias cabeças.


Lisboa, uma cidade que foi criada por subscrição nacional, continua em leilão de saldos eleiçoeiros. A esmagadora maioria dos lisboetas não tem acesso aos manuais tecnocráticos dos planeamantismos e aos dicionários de patos bravos que nos proíbem a cidadania! Será que o debate na RTP serviu a campanha pela abstenção generalizada? Aliás, fiquei a saber que todos os problemas da Frente Tejo e das obras do Terreiro do Paço são mera consequência do enquadramento do plano director no pogrom...a do Centenário da República, onde quase metade do tempo a comemorar foi ditadura salazarenta...