a Sobre o tempo que passa: Corrupção 8 - O problema da corrupção em Portugal é uma questão mais cientificamente politológica do que juridicamente criminal

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

27.1.08

Corrupção 8 - O problema da corrupção em Portugal é uma questão mais cientificamente politológica do que juridicamente criminal


Na mesma conferência, observei:


Há um tradicional conúbio do feudalismo financeiro e do negocismo com o comunismo burocrático e o subsistema de medo autoritário, dominantes na nossa dona Administração Pública.

Um problema que não resulta da crise dos valores, mas no facto do dinheiro se ter transformado no principal dos valores, o que leva alguns a proclamar que quando me falam de “inteligências”, puxo logo do meu livro de cheques...

O problema da corrupção em Portugal é uma questão mais cientificamente politológica do que juridicamente criminal,

Porque não podemos pedir aos senhores polícias, às estruturas do Ministério Público e aos juízes que façam um adequado levantamento de todos os grupos informais que circulam, numa sociedade aberta, entre aquilo que é o dinheiro que quer comprar poder e aquilo que são os agentes do poder, executivo, legislativo, autárquico, regional, partidário, judicial, policial, cultural, universitário ou comunicacional, que estão disponíveis para compra.

Mas o poder não se compra apenas com o dinheiro, mas também com a troca directa de favores.

O clientelismo, o nepotismo ou a distribuição de lugares visando dar jobs aos boys do respectivo partido é tão corrupção quanto as luvas recebidas por um manga de alpaca para que certo"dossier" seja mais rapidamente sujeito a despacho.

Não há maneira de entendermos a democracia de forma poliárquica e pluralista, onde o poder não é coisa que se conquiste, mas antes uma relação entre a sociedade civil e o aparelho de poder, onde o exercício da pressão e a manifesta exposição dos interesses é inevitável.

A “black box” do sistema político, que visa produzir decisões políticas, tem como "inputs" o jogo dos apoios e das reivindicações, onde a actividade de influência no processo decisório, através dos chamados grupos de interesse e grupos de pressão, constitui o normal dos anormais da política.


Aliás, um processo político entra em derrapagem quando quem manda deixa de obter o consentimento de quem é mandado pelo processo espontâneo da persuasão.

Quando isto acontece, quem manda não foge, passa a utilizar a técnica da manipulação, invocando a ideologia ou promovendo a propaganda.

Só na fase três é que pode assumir o autoritarismo, antes de atingir o clímax dos estados de excepção que utilizam a violência

Todo o processo político, de todos os tempos, sempre foi uma moeda com duas faces, uma visível e outra oculta, uma fingindo, no teatro do Estado-Espectáculo, outra jogando nas teias invisíveis da pressão.
A propósito do bastonário, dez observações sobre a corrupção: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10