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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

22.11.07

O país real. A fronteira com Espanha recuou para Setúbal



Nestas conversas de corredor, de que é feita a universidade, discutia há pouco com o meu colega Mora Aliseda sobre as diferenças de desenvolvimento entre o interior de Portugal e o interior de Espanha. Pouco depois, ele mandou-me um mapa, elaborado pelo Professor Doutor João Ferrão que, por acaso, é secretário de Estado do actual governo. Fiquei esclarecido. A azul claro estão as freguesias regressivas, a azul mais escuro, as que estão em coma. Percebi a falta que nos faz um resto de Estado que volte ao lema do rei povoador. E voltei a admitir que deveríamos acabar com a capital, começando pela compressão dos capitaleiros, especialmente dos que continuam a estratégia desenvolvimentista do crescer a caminho do mar sem crescermos por dentro e para dentro. Confirmei que Portugal é uma ilha, sem direito a jangada de pedra. Não tarda que sejamos atirados borda fora. E não há ninguém que declare o estado de emergência? Por mim, preferia a institucionalização de regiões, por razões de salvação pública, e que se apostasse numa estratégia nacional assente em perspectivas rurbanas...

Voltei a dar razão a meu mestre Herculano, quando ele denunciava o centralismo como um fideicomisso do absolutismo, mantido no liberalismo e na democracia. Percebi Joaquim Pedro de Oliveira Martins e a sua lei de fomento rural. Entendi Ezequiel de Campos e a sua denúncia sobre a falta de organização do trabalho nacional. Procurei saber se ainda existe um partido de agrocratas, como o defendeu Rodrigo Morais Soares. Dizem-me até que a semente lançada por Gonçalo Ribeiro Teles deu em fados e guitarradas, numa espécie de produção de novas melancias de outra cor, ao serviço do PSL.

E meditei nalgumas imaginações. Mudarmos o parlamento para o Porto. A sede do poder judicial para Coimbra. Restaurarmos o reino e o rei povoador, sem o confundirmos com a monarquia. E até me apeteceu propor que minha universidade deixasse de ser UTL e passasse a ser Universidade Técnica de Portugal, com todos os mestres e instalações lá para as bandas de Elvas, mas sem que se repetissem competidores em Lisboa. Cheguei à conclusão que me chamariam louco, por ousar uma espécie de um arquipélago de novas Portugálias, assim à maneira de Brasília, plurais e com diminutivos. Concluí apenas que estou a querer grandeza, incompatível com este Portugalório de bonzos, canhotos e endireitas. Mas não decidi calar.