a Sobre o tempo que passa: Estas tortuosas cedências ao estadão salazarento e aos epifenómenos das vigilâncias revolucionárias

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

29.6.07

Estas tortuosas cedências ao estadão salazarento e aos epifenómenos das vigilâncias revolucionárias


O PS sempre foi um partido das liberdades. Quase todos os PSs meus amigos têm aquela coerência de viverem como pensam. Os crescentes sinais de micro-autoritarismo subestatal que envolvem certos invocadores do carimbo PS provam que, para muitos "boys", na prática, a teoria é outra, por causa dos "jobs".

O cartaz jocoso, ácido em ironia para uns serviços públicos de saúde, afixado por um funcionário da CDU, levou ao afastamento do director, acusado de falta de lealdade. Não são precisos mais comentários. Até porque críticas à direita ou piadas vicentinas também levaram Balbino e Charrua ao espectáculo a que todos assistem.

Apenas estranho muitos dos silêncios públicos de muitos deputados e hierarcas do PS que, em privado, se têm indignado com estes sinais de crispação. A história dos macacos cegos, surdos e mudos não pode desculpar-se com sondagens. Todos vamos vendo, ouvindo e lendo, já ninguém pode ignorar. A não ser que se fiem no desencanto das maiorias silenciosamente cobardes, coisa que não se compreendem quando alguns desses micro-autoritários subestatais não passam de arrivistas, oriundos do estalinismo que só tardiamente se encostaram ao PS antitotalitário.


Se os subsolo ideológico de justificação do poder que marca alguns destes desvarios do regime de chefes de repartição pegar de estaca não tarda que se exija a identificação de todos os blogueiros de cada serviço público, bem como a listagem de dos funcionários que militam em partidos e associações cívicas que criticam o governo e o situacionismo.

Aliás, também seria útil que todos os programas de ensino fossem submetidos à mãozinha censória e, a nível do ensino, em cada aula deveria existir um vigilante que fizesse um adequado relatório a ser remetido para uma adequada central de registo dos não formatados pelo conceito de modernidade vigente.


Por mim, garanto que já fui sujeito a estes condicionamentos de forma não larvar. Para não falar no favoritismo dos chefes que praticam o regime do governo dos espertos, de acordo com a caracterização de Hannah Arendt fez da administração otomana. Isto é, com a elefantíase legislativa e regulamentar, a lei vigente é distorcida em favoritismo para os amigos e seguidores, mesmo que o chefe seja PS e os apoiantes da extrema-direita, e madrasta perseguidora para os que se opõem ou não vão a gabinte de sua excelência meter cunha ou dobrar a coluna em salamaleques.

Se o PS se deixar enredar nestas tortuosas cedências ao estadão salazarento, com alguns epifenómenos de vigilância revolucionária, os afastamentos regulamentares e disciplinares tornar-se-ão numa vaga de saneamentos e na consequente ditadura da incompetência. Os sinais são crescentes e não basta que alguns socialistas proclamem que estão de consciência tranquila e não recebem lições de democracia de ninguém.

Posso dar exemplos históricos de muitos partidos socialistas de outras eras que se deixaram enredar tanto em colaboracionismos com o totalitarismo nazi, como com o totalitarismo soviético. Felizmente, sempre houve partes sãs dos mesmos partidos socialistas que assumiram a dissidência e logo encabeçaram as resistências. É destes que reza a história da liberdade...

PS: Acabei de ver e ouvir a conferência de imprensa de um ministro da saúde sobre o caso Vieira do Minho. Palavras para quê? É mais um artista português que não usou pasta medicinal de Estado de Direito. O pior é que apareceu um tipo com coragem previamente, o médico causador do "fait divers", que até confirmou que a ex-directora chegou a levantar o adequado auto face ao incidente. Palavras para quê? O excelente ministro pós-licenciado na Escola Nacional de Saúde Pública até foi presidente do Instituto Nacional de Administração. Isto é, além de nos tratar da saúde também já foi responsável pela alta formação dos "jobs" para os nossos "boys". Por isso é que arranjou esta desculpa para o recrutamento do sucessor da tal "coitada", cujo adjectivo ministerialmente emitiu do alto do seu microfone. Seria melhor que lesse Montesquieu, a fim de poder distinguir negócios públicos de negócios domésticos. Não quero ministros com este tipo de discurso, próximo da origem etimológica da palavra Corte. A democracia merece mais. E o PS outro tanto. Arrependa-se, senhor "servus ministerialis"! Porque se este for o paradigma, o que farão os muitos subservidores
e os subservientes que querem agradar aos donos do poder?