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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.5.07

O bailinho da Madeira começa a propagar-se como mancha por todos os segmentos do aparelho público de poder

A decisão do Tribunal Constitucional relativamente às eleições lisboetas revela como os partidos dominantes do Bloco Central tratam a política, isto é, como uma coutada de caça, com reservado direito de admissão. A política são eles, os partidos-sol, com as respectivas sociedades de corte, de acordo com o desespero típico da hierarquia das potências e todo o universo dependente de satélites, pretensamente independentes, para que possam baralhar e dar de novo.

Neste sentido, mantém-se a principal herança de um absolutismo onde o príncipe não está sujeito à própria lei que edita e onde tudo o que ele diz é lei, para que continuemos submetidos à voz do dono, do supremo dono e dos pequenos donos do poder que eles vão propagando pela teia dos muitos micro-autoritarismos subestatais onde se reproduzem. Todos esses mandadores dizem que não estão agarrados ao poder e que têm a consciência tranquila, assumindo uma descarada partidocracia, onde dizem que tem razão quem vence.

Se não estamos à beira de uma ditadura das finanças, donde possa emergir um velho Estado Novo, já temos amplas coincidências com esse regime da usurpação que, entre nós, teve exemplo em António Bernardo da Costa Cabral. E não é por acaso que, mais uma vez, entram em cena as figuras do governador civil e de sucedâneos como o director regional. O que hoje se lê no jornal sobre um processo disciplinar a um professor e ex-deputado que contou uma anedota sobre Sócrates em privado, talvez aconselhe a que os agentes do poder montem uma rede de detecção de anedotas contrapoder contadas nos corredores dos serviços públicos. Aliás, até poderíamos utilizar os recursos do salto tecnológico para inventariarmos os blogues críticos do poder, ou um serviço de espionagem de "mails" emitidos por funcionários públicos, quando estão no exercício de funções.

Por outras palavras, o bailinho da Madeira começa a propagar-se como mancha por todos os segmentos do aparelho público de poder. Os meandros eleitorais da autarquia lisboeta já se aproximam do mesmo asco que quase todos podem observar noutros segmentos de assalto ao poder. É por isso que não vou hoje revelar pormenores de outros micro-autoritarismos de que todos somos vítimas, nomeadamente em segmentos universitários que consigo observar de mais de perto. Não os denunciarei, aqui, porque eles se aproximam cada vez mais da zona noticiosa dos casos de polícia e merecem a intervenção de outras instâncias. Os supremos mandadores não estão isentos das normas constitucionais e penais em vigor.

Os sinais da doença autoritária e os reflexos condicionados da persiganga estão a contaminar o edifício democrático e a confiança pública. O chamado défice democrático começa a penetrar nos fundamentos de um aparelho de poder que diz estar ao serviço do Estado de Direito, onde revigora o regime do enquanto o pau vai e vem folgam as costas.

Os manhosos que queriam impedir coligações já o conseguiram em Lisboa e a figura do antigo ministro da administração interna, superior hierárquico da senhora governadora civil, sai chamuscada por um eventual excesso de zelo de uma sua servidora. Outros pormenores mais deliciosos emitirei, dentro de dias, noutros segmentos do mesmo cabralismo. Apenas espero que as manobras de espionagem montadas por agentes formados pela mentalidade das escolas técnicas da PIDE atinjam os seus alvos, isto é, os avençados a que dão o nome de jornalistas e, pior do que isso, de professores.