a Sobre o tempo que passa: Neste ambiente inquisitorial, onde a história pode voltar a ser o género literário mais próximo da ficção

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

29.5.07

Neste ambiente inquisitorial, onde a história pode voltar a ser o género literário mais próximo da ficção



Um dos candidatos à autarquia de Lisboa bloqueou ontem as instalações da empresa municipal de saca multas aos carros mal estacionados, com uma fita da cor com que os fiscais da dita nos chateiam quotidianamente. Teve direito a telegrama da Lusa e a breve som na rádio, mas não passou para os diários de grande circulação no dia seguinte. O critério jornalístico foi mais soberano do que a lei que manda dar igualdade de oportunidades a todos os concorrentes a um acto eleitoral. O espaço de transmissão de notícias preferiu o camelo da JSD e a comissão de honra do ex-ministro Costa, onde estiveram várias notabilidades e gerontocratas, nomeadamente o retirado Freitas do Amaral, nomeado por Celeste Cardona reformador geral das prisões.


Por isso, reparei que entre os meus "mails", constava um do grupo
Lisboa, Renascer, onde pode ler-se: somos um grupo de três pessoas “conectadas” que pretendemos criar um grupo de 23 pessoas candidatas à Câmara Municipal de Lisboa, nestas eleições intercalares. Não temos, nem nunca tivemos partidos políticos, não somos de esquerda nem de direita, mas sim de “cima”. Procuramos o bem-estar pessoal e social, não num eixo de esquerda, direita, ou vice-versa, mas num eixo vertical de terra e céu. Com efeito, temos conhecimento dos problemas que afectam a Câmara Municipal de Lisboa e possuímos competências em engenharia, urbanismo, prospectiva de organizações, gestão, finanças, marketing.

Propomo-nos iniciar aqui e agora o quinto Império, isto é o Império do Espírito Santo. Queremos implementar aquilo que já foi desejado pela Rainha Santa Isabel, quando introduziu em Portugal o culto do Espírito Santo….
Não queremos o poder dos poderosos, mas o poder dos bons e sabedores, quer sejam de condição rica ou pobre, e poderosos ou não. Queremos dar origem a uma nova Terra! E isso só será possível se outro género de políticos passar a existir. E tudo pode começar neste acto eleitoral! Sabemos que Portugal, e neste caso Lisboa, já tem gente suficiente para perceber esta mensagem, e mesmo que anseiam ver esta alteração politica...Esta comunicação, e porque se dirige apenas aos portugueses com vida espiritual, onde queremos ter a nossa base de candidatura eleitoral, não se debruça sobre as razões de natureza técnica e politica, que será dada a todos aqueles que estiverem interessados em pertencer à lista de candidatos.

Como não estou assim conectado, não respondi afirmativamente ao convite deste movimento espiritual. Apenas reparei que, como cidadão de Lisboa, já tenho um passivo individual de uns terráqueos 2 382 euros, nomeadamente para o pagamento dos assessores do senhor presidente da câmara, entre os quais figuram vários ornamentos do "jet set" e outros tantos jornalistas avençados.

Por isso, lá tive, muito delicadamente, que declinar o convite recebido para participar numa dessas comissões de honra, que bem me poderiam colocar no centro desses clubes dos pretensos vencedores, com maior oleosidade em futuras cunhas, nomeadamente para os carros que, de vez em quando, tenho de estacionar em cima do passeio.
Confesso que a única cunha que era capaz de meter, e me podia comprar para o sistema, era a que me permitisse ver livre desse mesmo sistema, a caminho de um qualquer exílio que me libertasse dos esquemas do governo subsidiocrata a que nos condenaram.

Porque noventa por cento dos chamados candidatos a presidente do município lisbonense apenas pretende um lugarzito de vereador, enquanto os restantes sabem que apenas fazem campanha para, durante dois anos, fazerem mesmo campanha, para ocuparem o lugar para os outros quatro anos pós-intercalares, fazendo-nos esquecer que não passam de meros delegados daquela partidocracia que, depois de provocar o ruinoso incêndio, se quer agora assumir como uma espécie de bombeiro-pirómano.
Prefiro os helicópteros russos que, ontem, Rui Pereira foi comprar a Moscovo, com os títulos da dívida da velha Associação de Amizade Portugal-URSS.

Acho bem mais interessante o apelo à Rainha Santa Isabel, essa aragonesa que nos deu o milagre das rosas. Julgo que ela não participou ontem na assembleia-geral do milenar banco, onde, também ontem, se enfrentaram duas facções financeiras do Opus Dei, com a participação dos principais advogados lusitanos, nomeadamente o que, agora, se assume como grão-mandatário do ex-ministro Costa. Continuo a integrar o partido de el-rei D. Dinis, como me ensinou mestre Agostinho, lá na Travessa do Abarracamento de Peniche, entre gatinhos e sinais templários, com algum lume da profecia e muito mais lume da razão.

Não tenho pergaminhos espirituais suficientes para tal missão. Cartesiano e laicista demais para poder dialogar com o infinito, apenas sou uma potencial vítima de um qualquer hierarca decretino em excesso de zelo, que bem pode mandar um dos seus espiões ler estes postais do blogue, para imediata denunciação de ouvida junto do senhor director, ou da senhora directora, neste ambiente onde a história pode voltar a ser o género literário mais próximo da ficção.


Ao contrário dos que julgam que estou a fazer ironia, tenho de confessar publicamente que já fui vítima deste inquisitorialismo de trazer por casa, quando um senhor director, que costuma ler fotocópias deste blogue, transportadas por um público e notório especialista em espionagem, insinuou que eu era o autor de todas as coisas anónimas que, sobre ele, abundam na Internet. Por isso, agradeço aos militantes do PS Jorge Coelho e António Vitorino, a pronta defesa da liberdade que emitiram, dado que assim atalharam a ameaça dos candidatos a Hugo Chávez que por aí circulam, com cartão do PS e apoio aliancista de fascistas reais e estalinistas não arrependidos. Vale-nos que ainda há activistas do Espírito Santo, banqueiros do Opus Dei, madeirenses como Berardo e uma ampla maioria de socialistas liberdadeiros, com quem lutei pela liberdade, quando muitos cristãos-novos do actual partido da rosa ainda eram idiotas úteis dos nossos totalitarismos e autoritarismos.

Hoje, entro em dia de reflexão. Vou decidir se amanhã farei ou não greve, integrando a lista de suspeitos, informaticamente registável, atrás dos comunistas da CGTP, contra as chouriçadas gaguistas. Para tanto, irei reler o artigo do funcionário público António Barreto sobre o presente socratismo. Da última vez que estive com o actual líder do PS, em reunião não privada, testemunhei a fúria que se apossou do actual primeiro ministro, quando invoquei o nome do ilustre sociólogo, que, por mim, bem gostaria de ver como candidato a presidente da autarquia lisbonense...Pelo menos, faria a diferença face ao azul e vermelho dos cartazes de Fernando Negrão da Costa que, lado a lado, nos vão poluindo no mais do mesmo.

Continua obsidiante esta minha vontade de quebrar as algemas que me ligam ao decretino e à escravatura dos pretensos reformistas que nos cavalgam e que transformaram os aparelhos de Estado que ocuparam, em esgoto para as respectivas frustrações, eliminando espaços da sagrada autonomia das pessoas e dos grupos não estatizados que nos davam o bem comum. Até a própria universidade não escapa aos pretensos manipuladores da engenharia social, justificando-se, mais uma vez, a resistência da urgente federação dos homens livres, de todos esses pequenos proprietários dos respectivos saberes e carreiras, conquistadas a pulso e que não podem ceder aos pequenos tiranetes e ressaibados que se preparam para esmagar as autonomias daqueles indivíduos e grupos, donde se fez pátria.