a Sobre o tempo que passa: A caneta do século XXI, onde o hábito não faz o monge

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

15.3.07

A caneta do século XXI, onde o hábito não faz o monge

Sim! Nada de novo debaixo do sol deste Março com quase manhãs de Verão. Apenas que minha caravana vai passando, neste quotidiana renda de bilros de investigador, a actualizar a sua lista da classe política portuguesa desde 1820 e os seus ciclos do Portugal Político, já disponíveis na rede, mas com muitas imperfeições, sobretudo para uso dos meus alunos de história da administração pública. Entretanto, à minha volta sinto que continuam tempestades de areia, neste deserto de ideias que nos vai sufocando.

Nos intervalos, vou comentando comentários, nesta minha missão de publicista, ao serviço de causas. Ainda ontem, o Manuel Acácio da TSF pedia-me que reflectisse em público por causa do blogue de António Costa/ José Magalhães. E lá tive que dizer que a tecla e o fio que nos liga a esta nova biblioteca de Alexandria que é a Internet, estarão para o século XXI, como a máquina de escrever esteve para o século XX e a caneta para o século XIX, mas não é por termos uma esferográfica que somos autores de livros.

Não é a posse do "hardware" que nos permite fazer o "software", não é o "continente" que gera o "conteúdo", mas antes a maneira como aprendemos a navegar, navegando, pela invenção e pela criatividade. E neste nosso tempo de propagandismos sobre os choques tecnológicos há muito provincianismo e imensa iliteracia.

Dizer que se faz um blogue ou que se tem uma página na Net faz parte da imagem da gente fina e, naturalmente, afecta a classe partidocrática. Mas basta notar como depois da ida de José Magalhães para o governo o sistema de blogues dos deputados ficou-se por alguns ratinhos. E não são raras as excelências ministeriais, deputáveis ou professorais que precisam do assessor, da secretária ou do assistente para que estes lhes abram os "mails" ou lhes fotocopiem os "blogues".

Um desses, por acaso das ciências exactas, estranhando que um homem das ciências humanas como eu andasse de computador à trela, muito desconfiado, cheio de manha, só depois de alguns anos ganhou coragem para lhe explicar como é que se podia usar o til ou meter a disquete. Outro chegou a adquirir o sistema "wireless" para a respectiva repartição, quando ele surgiu, mas deixou-o empacotado durante anos e anos.

Por isso desconfio de todos este planos da pólvora dos engenheirais lançadores de megaprojectos que não se preocupam com uma estratégia de criatividade e se deixam enredar no charlatanismo dos plagiadores e carreiristas, a quem em épocas vindouras apenas chamávamos vigaristas.

Nada disto tem a ver com a aventura de António Costa e de José Magalhães nos mundos da blogosfera oficiosa. Será sol de tanta dura quanto a interferência dos partidos ou das candidaturas partidárias neste domínios do ponto.come. Este espaço pertence aos indivíduos que quotidianamente se escrevem e comunicam com um público anónimo, mas fiel.

O que seria se alguns ministros e partidcoratas, todos os dias, se desnudassem em ideias, lançando-se na rede, mas sem a rede dos assessores de imagem? Apenas confirmaríamos que vivíamos num deserto de ideias, onde muitos cães ladram, mas onde a caravana de quem tem uma ideia de obra, respeito pelas regras processuais e manifestações de comunhão entre o respectivo público.